quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Notas sobre o "Tratado sobre os princípios do conhecimento humano" de George Berkeley



Definição do que é filosofia para Berkeley - "O desejo da sabedoria e da verdade."

Os que se dedicam a filosofia possuem vantagens que os que não se dedicam não possuem.

A maior parte da humanidade é guiada pelo senso comum, e por isso não desconfiam do que lhes é familiar.

Há dificuldades para aqueles que querem viver de acordo com um princípio superior. A causa das dificuldades qual seria? A obscuridade das coisas ou a natural fraqueza e imperfeição do nosso conhecer?

O problema não está em nossas faculdades, mas em nosso mal uso delas.

Deus não nos daria um forte desejo de conhecimento se não o tivesse colocado a nosso alcance, se não tivessemos meios para satisfezer nossos apetites intelectuais.

Nós é que provocamos nossas maiores dificuldades.

Temos de buscar a resposta nos primeiros principios do conhecimento humano. Verificar os falsos principios que causam dificuldades e que devemos rejeitar.

A tarefa de ir aos primeiros principios de conhecimento não é facil, mas devemos arriscar, ainda que muitos não tenham conseguido.
É preciso verificar inicialmente a natureza e o abuso da linguagem. O problema é que muitos dizem que é possível construir idéias abstratas.As qualidades existem nos objetos e não fora deles! Apesar disso o espírito procura fazer abstrações. Mas como extrair extensão, cor e movimento dos objetos? Existe a extensão das extensões, a cor das cores e o movimento dos movimentos?

sábado, 1 de novembro de 2008

Filósofo do Mês: Friedrich Schelling


"Toda essa ideia de uma felicidade como recompensa - que outra coisa seria, portanto, senão uma ilusão moral: um título de crédito com o qual se compra de ti, homem empírico, os teus prazeres sensíveis de agora, mas que só é pagável quando tu mesmo não precisas mais do pagamento. Pensa sempre nessa felicidade como um todo de prazeres que são análogos aos prazeres sacrificados agora. Ousa, apenas, dominar-te agora; ousa o primeiro passo de criança em direção à virtude: o segundo já se tornará mais fácil para ti. Se continuares a progredir, notarás com espanto que aquela felicidade que esperavas como recompensa do teu sacrifício, mesmo para ti não tem mais nenhum valor. Foi intencionalmente que se colocou a felicidade num ponto do tempo em que tens de ser suficientemente homem para te envergonhares dela. Envergonhar, digo eu, pois, se nunca chegas a sentir-te mais sublime do que aquele ideal sensível de felicidade, seria melhor que a razão jamais te tivesse falado.
É exigência da razão não precisar mais de nenhuma felicidade como recompensa, tão certo quanto é exigência tornar-se mais conforme à razão, mais autónomo, mais livre. Pois, se a felicidade ainda pode recompensar-nos - a não ser que se interprete o conceito de felicidade contrariamente a todo o uso da linguagem -, ela é então uma felicidade que não é trazida, já, pela própria razão (pois como poderiam razão e felicidade jamais coincidir?), uma felicidade que, justamente por isso, aos olhos de um ser racional, não tem mais nenhum valor. Deveríamos, diz um antigo escritor, considerar que os deuses imortais são infelizes porque não possuem capitais, bens territoriais, escravos? Não deveríamos, antes, exaltá-los como os únicos bem-aventurados, justamente porque são os únicos que, pela sublimidade da sua natureza, já estão despojados de todos aqueles bens? - O mais alto a que podem elevar-se as nossas ideias é manifestamente um ser que, com auto-suficiência absoluta, frui somente do seu próprio ser, um ser que cessa toda a passividade, que não é passivo em relação a nada, nem mesmo em relação a leis, que age com liberdade absoluta, apenas em conformidade com o seu ser, e cuja única lei é a sua própria essência." ( Friedrich Schelling, 'Sobre o Dogmatismo e o Criticismo' )

sexta-feira, 25 de julho de 2008

O valor da filosofia para Bertrand Russell


O valor da filosofia encontra-se, de fato, na sua própria incerteza. O homem sem rudimentos de filosofia passa pela vida encarcerado nos preconceitos derivados do senso comum, das crenças habituais do seu tempo ou da sua nação, e de convicções que se desenvolveram no seu espírito sem a cooperação ou o consentimento da sua razão ponderada. Para tal homem, o mundo tem tendência a tornar-se definido, finito, óbvio; os objetos comuns não levantam questões, e as possibilidades estranhas são desdenhosamente rejeitadas.
Mal começamos a filosofar, pelo contrário, descobrimos […] que até as coisas mais corriqueiras levantam problemas a que só podemos dar respostas muito incompletas. A filosofia, apesar de ser incapaz de nos dizer com certeza qual é a resposta verdadeira às dúvidas que levanta, tem a capacidade de sugerir muitas possibilidades que alargam os nossos pensamentos e os libertam da tirania do hábito. Assim, apesar de diminuir a nossa sensação de certeza quanto ao que as coisas são, a filosofia aumenta em muito o nosso conhecimento do que elas podem ser; ela elimina o dogmatismo algo arrogante daqueles que nunca viajaram no território da dúvida libertadora, e mantém vivo o nosso sentido de deslumbramento ao mostrar coisas familiares sob um aspecto estranho.
(Bertrand Russell, Os Problemas da Filosofia, 1912, p. 90)

Lições em Leibniz (Parte 3)


Qual o fundamento de todas as verdades?
Para Leibniz esse fundamento não pode ser a experiência, e passa assim a elencar as razões disso. Primeiro, os sentidos não são suficientes, visto que nos põem em contato apenas com verdades particulares ou individuais, o que não é suficiente para estabelecer a universalidade dessa verdade.Em outras palavras, se partimos de nossa experiência individual(e para isso usamos os sentidos) jamais poderemos determinar que essa experiência é universal e válida para todas as pessoas, épocas e locais, pois segue que aquilo que aconteceu conosco não acontecerá necessariamente da mesma forma com outra pessoa. Na verdade, o valor dos sentidos está em dar ocasião para prestarmos atenção ou percebermos as verdades inatas que existem em nós, assim como mais ou menos as provas servem a aritmética para melhor evitar o erro do cálculo quando o raciocínio é longo.
Segundo, como os homens são diferentes dos animais, não podem portanto serem regulados pela experiência. Os animais têm a impressão de que o que aconteceu com eles deverá se repetir, porque se guiam pela experiência, porém o homem tendo a consciência de que só a razão é capaz de estabelecer regras seguras, tendo ciência das exceções, inferindo conexões onde existem e rejeitando onde não as há, não pode se pautar unicamente pela experiência, mas por um princípio superior e inato.
Terceiro, mesmo os defensores do empirismo admitem idéias que não têm origem apenas na sensação, mas que provém da reflexão. E o que é a reflexão senão uma atenção aquilo que está em nós? E os sentidos não nos dão aquilo que já trazemos em nós. E se somos inatos a nós mesmos poder-se-ia negar que existem muitas coisas inatas em nosso espírito?
Por fim, é inconveniente concluir que nada pode ser desenterrado de dentro de nós, que nossa alma seja vazia,e que ela não é nada sem as imagens que recebe de fora. Mesmo em lousas vazias encontraremos algo que as diversifique umas das outras. E jamais se verá um plano completamente unido e uniforme. Sendo assim, não seremos capazes de fornecer de dentro de nós mesmos algum pensamento? Não estaríamos subestimando muito o ser humano?

sexta-feira, 18 de julho de 2008

BIOGRAFIA DE GRANDES FILÓSOFOS:EPICURO(2)


III - Filosofia
Para Epicuro a filosofia é mais do que discussões teóricas, é acima de tudo um estilo de vida. Seus discípulos não iam aprender a filosofia dele, mas "aprender o próprio Epicuro". Havia uma simbiose entre teoria e prática, entre pessoa e ensino.
A finalidade da filosofia era dupla: a felicidade humana e a liberdade, do contrário não haveria o porquê de filosofar. Nunca era tarde demais para tal tarefa, afinal, crianças, jovens e velhos sempre estariam buscando a felicidade e a liberdade, portanto jamais a filosofia deveria ser deixada de lado.
Para haver felicidade era necessário o prazer, mas não qualquer prazer. A filosofia proporcionaria a maneira de selecionar os melhores prazeres. Epicuro classificava os prazeres em três gêneros: os naturais e necessários (nutrição e sono), os naturais e não necessários (o sexo), e os não naturais e não necessários(todos aqueles resultados das opiniões). Porém, havia o prazer dos prazeres, aquele que estava acima de todos os três tipos mencionados, que era a ‘ataraxia’. A ataraxia consistia num estado de harmonia e serenidade interior a despeito das adversidades e circunstâncias. Estava acima de todo e qualquer prazer porque era um prazer constante e não de movimento como os mencionados. Em outras palavras, era um prazer permanente e não temporário. A grande antítese dos prazeres era a dor. Epicuro acreditava que o caminho natural do homem era fugir da dor e buscar o prazer. Entretanto, jamais conseguiríamos ficar totalmente imunes da dor, haja vista, as tragédias que se abatem sobre os indivíduos, em decorrência de acidentes ou perdas. Neste caso, Epicuro propunha um remédio duplo: as recordações e as projeções. Isso quer dizer que num momento difícil recordar situações passadas positivas aliviariam a dor, bem como projetar para o futuro coisas positivas que ainda poderiam ser realizadas. Ainda sobre o prazer Epicuro dizia que não poderíamos ser escravizados por eles, mesmo porque felicidade e liberdade andam de mãos juntas, por isso devíamos selecionar os prazeres como que tendo domínio sobre eles.
Sobre a liberdade, Epicuro utilizava-se de alguns aspectos da filosofia física para discorrer sobre o assunto. O mundo se formou dos átomos, que eram eternos, indivisíveis, variados e infinitos. Os átomos para se movimentarem necessitavam de espaço, o vácuo, que também era infinito. À medida desses movimentos a matéria era composta, neste caso até mesmo a alma é substância material, com a diferença de ser constituída por átomos mais delicados, leves e finos. Os átomos fazendo trajetória verticais em sentido de queda se chocariam devido a um desvio próprio chamado de ‘clinamen’, e este explicaria a liberdade atômica e consequentemente a humana. Assim como os átomos são livres para se chocarem e darem origem a novas vidas, os humanos são livres para mudar suas vidas. Uma outra idéia central sobre a liberdade é a de que os homens são escravos do medo, e para serem libertos deverão vencer os dois maiores temores humanos: o medo da morte e dos deuses. O medo da morte é vencido quando se tem consciência de que tudo é átomo e vácuo, isso quer dizer que quando o homem existe a morte não existe, e quando a morte aparece o homem não mais existe, portanto não há porque temer aquilo que não existe quando existimos. Vida significa átomos harmonizados e conjugados, e morte significa átomos desarmonizados e separados. Dentro dessa concepção há a negação da imortalidade da alma, o homem não deve mais se preocupar com o que virá após a morte, deve-se preocupar com o presente, com a melhor vivência possível do hoje e não com as preocupações inquietantes do amanhã. Quanto ao medo dos deuses, não era necessário se apavorar com tal coisa, afinal das contas os deuses também eram formados por átomos, mas de uma categoria tão perfeita, que viviam numa zona além daquela que os homens habitavam. Isso quer dizer que se os deuses eram perfeitos jamais se preocupariam com os homens que são imperfeitos, porque caso contrario poderiam se manchar com a imperfeição humana. O estado de gozo dos deuses era tão perfeito que jamais pensariam no homem que não alcançou o pleno gozo. Para Epicuro os sacerdotes utilizavam-se dos mitos e do temor dos deuses para manipular e escravizar as pessoas.
Dentro do campo da teoria do conhecimento, Epicuro a divide em três momentos: a experiência, a memória e as relações. Por meio da experiência poder-se-ia chegar a verdade, o homem conhece a medida que vivencia, ou seja, o empirismo. No empirismo é fundamental a relação entre a sensação e a percepção, e é por meio desta última que posso ser enganado ou ter certeza da verdade. Por exemplo: Se olho ao longe o que parece ser um pedaço de árvore e depois ao me aproximar percebo ser um cachorro deitado, fui enganado pela minha percepção, porém também corrigido por ela. Para evitar os enganos era imprescindível observar e analisar os objetos com cuidado. Para Epicuro aqueles que dogmatizam um determinado aspecto do objeto sem analisá-lo por todos os ângulos possíveis com muito cuidado, criam o mito. Aquilo que pela sensação temos a percepção vira uma antecipação ou memória. Por exemplo: Se vejo um livro, aquilo fica registrado em mim, de tal maneira que não terei dificuldade de identificar outro objeto semelhante e reconhecê-lo como livro, já que tive a experiência do livro, e se tive a experiência tenho dali em diante a idéia de livro.A memória então é fruto da experiência, e só posso ter noção daquilo que vivencio. Porém, há coisas das quais não temos sensações e são reais, por exemplo, o átomo e seu movimento. Neste caso Epicuro ensina a chamada não-infirmação, ou seja, fazer relações. Pensando na questão do átomo relacionamos sua realidade com o corpo e o movimento, pois, assim como o corpo se movimenta, o átomo também se movimenta já que o corpo é constituído por eles, e só há movimento onde há espaço para tal. Ou seja fazemos relações de coisas que não podem ser captadas pelos sentidos e percebidas com coisas que podem dentro de um elo lógico.
Relacionado a ética a discussão de Epicuro gira em torno das duas grandes virtudes: a sabedoria e a amizade. A primeira é resultado de seguir sua filosofia (lógica, física e ética), que para os epicureus(assim eram chamados os discípulos) estava acima das concepções socráticas, platônicas e aristotélicas. O sábio era autônomo e não autômato, era lei para si próprio, de tal forma que para Epicuro as leis não existiam para que o sábio não cometesse injustiça, mas para que não fossem cometida injustiças contra ele.A segunda, a amizade, era a maneira dos homens se relacionarem entre si e desfrutarem uns dos outros. Epicuro era contra o matrimônio e a concepção de família egoísta(pai, mãe e prole), todos deveriam relacionar-se como irmãos entre si, e o amor estava acima de qualquer convenção social. Entretanto, a amizade deveria ser entre iguais, a dependência se é que deveria existir, deveria ser recíproca, para que ninguém fosse escravo de ninguém, o que deporia contra a filosofia da liberdade. Ninguém deveria ser desprezado no circulo de intimidade, todos eram dignos de respeito e apreço, até mesmo os escravos.

BIOGRAFIA DE GRANDES FILÓSOFOS:EPICURO (1)



I -Vida
Epicuro nasceu na cidade de Atenas em 341 a.C., num período marcado pelo domínio macedônico sobre a Grécia e a perda de independência política das cidades-estados. Isso ocasionou uma certa decepção com a religião e a política entre os gregos, tirando-lhes a expectativa de dias melhores, substituindo por uma visão sombria do futuro.
Filho de uma família nobre, cujo pai, Néocles era professor, e a mãe Queréstrata era advinha, o menino Epicuro destacou-se no pensamento reflexivo desde a mais tenra idade. Em uma de suas aulas de gramática na cidade de Samos,ao ouvir de seu mestre que o mundo viera do caos, interpolou em seguida, de onde então viera o caos. Ao que o mestre não soube responder e encaminhou-o aos filósofos. Tomando contato com as diversas filosofias do período, Epicuro abraçou as idéias materialistas de Demócrito e Léucipo que explicavam todas as coisas à partir dos átomos. Voltou a Atenas, iniciando uma curta carreira como professor de gramática, decidindo-se lecionar filosofia, fundando sua própria escola, conhecida como “O Jardim”, por ser uma propriedade composta de uma casa e um grande e belo jardim, onde os alunos aprendiam em contato com a natureza. Fundiu conceitos do atomismo com idéias originais e criou sua própria filosofia. Angariou muitos simpatizantes e discípulos, muitos deles que não se satisfaziam mais com as explicações de Platão e Aristóteles, que centralizavam em torno da política suas discussões que não coadunavam mais com a realidade da falta de independência política grega. Mais do que simples seguidores, eram amigos de Epicuro, cuja personalidade era marcada por simpatia, benignidade, carisma, delicadeza, sinceridade, serenidade e compaixão. Epicuro devotou-se a filosofia e aos seus amigos, e viveu até os setenta e dois anos de idade, falecendo em decorrência de uma enfermidade que lhe atrofiava os membros e impunha-lhe dores constantes e agudas. No seu último dia de vida escreveu a um precioso amigo:

“Este dia em que te escrevo é o último dia da minha vida e é também um dia feliz. Sinto dores na bexiga e nas entranhas que nem se poderia imaginar, dores mais violentas; mais esses sofrimentos são compensados pela alegria que traz à minha alma a recordação das nossas conversações.”

II -Obras
A filosofia de Epicuro foi dividida em três partes essenciais: lógica ou canônica, física, e ética. A primeira tratando-se da teoria do conhecimento e o método para se chegar ao conhecimento da verdade; a segunda mostrando a constituição de todas as coisas resultado do movimento dos átomos no vácuo; e a terceira a maneira de ser feliz e se comportar diante do mundo. Respeitando essa divisão em suas obras, ele foi um dos escritores mais fecundos da Antiguidade, tendo composto mais de trezentos tratados, entre os quais: um Tratado da Natureza, em trinta e sete livros, sobre os átomos e o vácuo, resumo do que escreveu contra os físicos; objeções dos megarenses; dos deuses, da santidade, dos fins, das maneiras de viver (quatro livros), da justiça e das outras virtudes, dos dons do reconhecimento, da música; depois, livros intitulados Queredemo, Hegesianax, Néocles, Euríloco, Aristóbulo, Timócrates (três livros), Metrodoro (cinco livros), Andidoro (dois livros), Anaxímenes,etc.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Filósofo do mês: Montaigne



"O principal efeito da força do hábito reside em que se apodera de nós a tal ponto que já quase não está em nós recuperarmo-nos e refletirmos sobre os atos a que nos impele. Em verdade, como ingerimos com o primeiro leite hábitos e costumes, e o mundo nos aparece sob certo aspecto quando o percebemos pela primeira vez, parece-nos não termos nascidos senão com a condição de nos submetermos também aos costumes; e imaginamos que as idéias aceitas em torno de nós, e infundidas em nós por nossos pais, são absolutas e ditadas pela natureza. Daí pensarmos que o que está fora dos costumes está igualmente fora da razão, e Deus sabe como as mais das vezes erramos. Se, como nós que estudamos, aprendemos a fazê-lo, todos, ao ouvirem judiciosa observação, aplicassem o ensinamento no que lhes diz respeito, veriam, incontinenti, que não constitui simples frase bonita, mas é verdadeira chicotada na tolice habitual de nosso julgamento. Mas recebemos as advertências da verdade como se se endereçassem aos outros e não a nós mesmos, e, em vez de aproveitá-las a fim de melhorar os nossos costumes, nós nos contentamos, muito tola e inutilmente, em a catalogar na memória." (Montaigne,Ensaios, Capítulo XXIII,página 61)

Razões do ateísmo em André Comte-Sponville


Sponville no livro "Apresentação da Filosofia" dedica um de seus capítulos para discorrer sobre as razões do ateísmo. De início mostra que há dois tipos de ateísmo: o negativo, aquele que não crê em Deus, e o positivo, aquele que crê que Deus não existe. Para dar a razão desse último ele esboça alguns argumentos interessantes:



1. A fraqueza dos argumentos dos teístas



Os teístas possuem tantos argumentos como experiências fracas. Se Deus existísse devería-se vê-lo e sentí-lo mais. Ao argumento teísta de que "se Deus se mostrasse em toda sua glória não seríamos livres para crer Nele ou não, ou duvidar",Sponville contrargumenta que:



a) Se ser livre é poder duvidar seríamos mais livres do que Deus por que ele jamais duvidaria de si mesmo.



b) Os profetas de acordo com relatos bíblicos tinham um contato mais próximo de Deus entretanto havia espaço em suas vidas para inúmeras duvidas e incertezas.



c) Sempre há menos liberdade na ignorância do que no saber.



d) Um Pai perfeito infinitamente superior aos pais humanos poderia abrir possibilidade para amá-lo, obedecê-lo, respeitá-lo ou não, o que supõe no mínimo a consciência clara de sua existência. Como amar, respeitar ou obedecer alguém que ao contrário dos pais humanos nem sequer tem- se prova concreta de sua existência?



e) Concluir a existência de alguém deduzindo-a de "escritos sagrados"(deveras contraditórios uns com os outros e está ai a diversidade de religiões refletindo isso) ou da natureza imperfeita e por vezes até imprevisível é no mínimo insensatez.



2. A contradição de explicar com o inexplicável.



A maior força da crença em Deus e do domínio das religiões é justamente a possibilidade de explicar o mundo, a vida e o pensamento.



A pergunta é- de que valem essas explicações se Deus por definição é inexplicável?Em outras palavras, que é a religião do que uma tentativa de explicação de uma coisa que não compreendemos através de alguma coisa que compreendemos menos ainda(Deus)?



Não conseguimos explicar tudo, e isso até os ateus admitem, o problema é tentar utilizar esse "mistério" do mundo acercando-se de explicações religiosas dogmáticas, cujo fundamento é o próprio inexplicável. Enfim, as explicações buscadas pelos religiosos giram em torno de antropormofismos de um Deus que cria o homem a "sua imagem e semelhança". E como dizia Voltaire - "se Deus nos fez à sua imagem nós o reproduzimos muitos bem". O universo e a própria vida são bem mais profundos do que a Bíblia ou o Corão possam "revelar".



3.O argumento do mal



O mal no mundo é incoerente com a idéia de um Deus absolutamente bom e onipotente. O mal é uma objeção mais forte contra a fé do que o bem contra o ateísmo. Como dizia Epicuro: "se Deus quer eliminar o mal e não consegue, ele não é onipotente; se Deus consegue eliminar o mal e não quer, ele não é perfeitamente bom; mas se ele não quer e nem pode eliminar o mal, não é mais Deus."



Como aceitar um Deus que se esconde diante de tantas atrocidades, guerras e mortes? Se não aceitamos tal comportamento covarde dos pais humanos como aceitar de alguém que deveria em teoria ser perfeito amor?



4. O efeito e a causa



A humanidade é algo muito pequeno para ser conseqüência de alguém tão grande. Como dizia Pascal por todo lado temos mediocridade demais, baixeza demais, miséria demais, e grandeza de menos. A humanidade é uma criação tão irrisória, como que um Deus poderia querer isso?



Os teístas se orgulham narcisicamente em sua crença, como se fossem mais do que de fato são, infudem todas as ações de Deus em torno de si mesmos, como se a razão da "existência" de Deus fossem eles mesmos!!!Não teríamos ai em evidência da idéia de que na verdade o homem criou Deus?



Em contrapartida o ateísmo é uma forma de humildade. É considerar-se um animal que somos, e deixar-nos o encargo de nos tornar humanos.



5. Deus é tanto menos verossímil quanto mais é desejável.



Que desejamos acima de tudo? Não morrer, reencontrar os seres queridos que perdemos, ser amados. E o que diz a religião? Quais desejos justamente ela satisfaz? Crer em Deus é crer num Papai Noel na potência infinita. A crença é por demais cômoda para ser verdadeira.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Ponto de contato

O por do sol que me recordo é de um fim de tarde numa praia, em que a luz num vigor que se desvanecia, se refletia sobre o mar, e me angustiava, porque sentia a vida como momentos de monôtomia que aparece e se apaga, que segue um ciclo mecânico e sem sentido, e na qual damos significados para não sermos tragados por ela.
Lições em Leibniz (Parte 2)
Leibniz tinha a preocupação na sua obra literária em dar "razão à razão" . Isso quer dizer que nem a tradição e nem a autoridade estariam acima do crivo racional. Não é porque algo é antigo, seguido e crido pela maioria ou que conte com a aprovação e o endossamento de alguém importante, sincero, inteligente e honesto que seja de fato verdadeiro. Se for por amor a verdade que as autoridades e a tradição existem, é por amor a essa mesma verdade que não temerão serem questionadas, julgadas e avaliadas. Ainda que aquilo que é ensinado seja belo, popular e traga bons frutos e sentimentos, isso não é o suficiente para provar a veracidade de uma idéia. A verdade por vezes é amarga e exige atitudes contrárias ao que a tradição consagrou. E mais, se a razão é de fato o crivo da verdade, pode-se dizer que a estrutura racional e as idéias que a compõe é algo que nasce conosco ou que é construído só a partir da experiência? Para dar conta de solucionar esse problema Leibniz esclarece que sua intenção é de comunicar sua filosofia de maneira a se fazer o mais entendido possível e não impressionar ou obscurecer com jogos de palavras. E dentro dessa intenção utilizou o recurso do diálogo, tão comum nos escritos filosóficos gregos. Para isso são criados dois personagens, Filaleto e Teófilo, o primeiro sendo uma espécie de porta voz das idéias de Locke, e o segundo do próprio Leibniz. Então, centraliza-se a discussão na origem do conhecimento e em torno do fundamento da verdade. Somente pela experiência através dos nossos sentidos conhecemos, ou trazemos algum conhecimento inato e que é desperto por essa mesma experiência? Contribuímos de alguma forma com o fundamento da verdade ou esse fundamento está em algo fora de nós? Essas são questões que o filósofo irá se debruçar.

terça-feira, 25 de março de 2008

Filósofo do mês: Blaise Pascal
"Não nos satisfazemos com a vida que temos em nós e no nosso próprio ser:desejamos viver na idéia dos outros uma vida imaginária,e, para isso, esforçamo-nos por fingir. Trabalhamos incansavelmente para embelezar e conservar nosso ser imaginário e negligenciamos o verdadeiro. E se temos tranquilidade, ou generosidade, ou fidelidade, apressamos em fazê-lo saber a todos, a fim de relacionar essas virtudes a esse nosso outro ser; e de bom grado as destacaríamos de nós para uni-las a ele; e seríamos prazerosamente covardes para adquirir a reputação de corajosos. Grande marca do vazio de nosso próprio ser, não estar satisfeito com um sem o outro, e renunciar muitas vezes a um pelo outro! Pois quem não morresse para conservar sua honra seria infame. Somos tão presunçosos que desejaríamos nos tornar conhecidos por toda a Terra,e até pelas pessoas que vierem quando nela não estivermos mais, e somos tão vãos que a estima de cinco ou seis pessoas que nos rodeiam nos diverte e nos compraz." (Pensamentos, página 72)

Maquiavel e "O Príncipe" (Parte 2)

Antes de entrar para a segunda parte da discussão do livro, o autor sintetiza o que expôs na seção anterior, mostrando sua finalidade de apontar os tipos de principados, a causa do sucesso e da ruína deles, os modos como adquiri-los e conservá-los, isso tudo para introduzir o assunto seguinte – os meios ofensivos e defensivos utilizados por esses principados. Segue as bases essenciais desses principados – as boas leis e os bons exércitos. Focando-se os exércitos, o autor chega a advertir sobre o uso de mercenários ou auxiliares, recomendando a utilização de tropas próprias. As tropas mercenárias ou auxiliares são inúteis e perigosas, o príncipe nunca terá tranqüilidade e nem segurança, pois elas são desunidas, ambiciosas, sem disciplina, infiéis, corajosas diante dos amigos e covardes diante dos inimigos e sem temor a Deus. Querem ser soldados do patrão enquanto ele não faz guerra, mas ao romper esta, querem fugir ao compromisso. É grande a responsabilidade e importância do príncipe diante de sua tropa, e não deve cultivar outra arte a não ser a da guerra juntamente com as regras que ela requer para conservar seu estado.
Na terceira parte do livro vemos a série de orientações que o autor dá para o príncipe ter um excelente desempenho político e se manter no poder. Para Maquiavel o príncipe deve se exercitar na guerra tanto na ação quanto na mente, deve ater-se ao seu modo de conduta diante dos súditos e seus amigos não preocupando-se em ter todas as qualidades mencionadas em seu livro, mas pelo menos aparentar tê-las, deve evitar se fazer odiado pelo povo conservando-o contente, cuidar da escolha correta dos ministros e evitar os bajuladores.
Enfim, O Príncipe é recomendável para todos aqueles que queiram tomar contato com as mudanças que a política sofreu na modernidade. Apesar de ter sido escrito no século XVI, é ainda muito útil e atual, pois trata de questões e de posturas tão comuns e pertinentes na nossa política, possibilitando uma maior compreensão das ações de nossos governantes, para uma tomada de consciência maior na construção de nossa cidadania.

Maquiavel e "O Príncipe" (Parte 1)

O Príncipe, escrito por Nicolau Maquiavel (1469-1527), é fruto de sua intensa observação e vivência no mundo político, foi dedicado ao estadista da República Florentina, Lorenzo de Médici, e podemos dividi-lo em pelo menos três partes: sobre os principados (Capítulo I a XI), sobre as milícias e exércitos (Capitulo XII e XIII) e sobre a conduta de um príncipe (Capítulo XIV a XXVI). Impresso em 1532, cinco anos após a morte de seu autor, ainda hoje é objeto de discussão e controvérsia, isso porque seu conteúdo transita pela delicada relação entre ética e política e suas implicações na formação do caráter de um governante. O livro ocupa-se em responder questões como – quais são os tipos de principados e como devem ser governados? Que função cumpre as leis e as armas nos principados? E de que maneira o príncipe deve proceder para se manter no poder?
De início, observamos que a técnica literária utilizada por Maquiavel segue um estilo de “aconselhamento”, dando-se uma série de recomendações e orientações, afim de que possa surgir um defensor e redentor da Itália, num verdadeiro fervor patriótico. Utiliza-se para reforçar suas idéias de constante exemplos de nomes da política como Cesare Borgia, Francisco Sforza, Filipe da Macedônia e outros. Podemos notar a presença de um amoralismo, onde o príncipe deve agir sem consideração dos meios empregados para conseguir os fins visados.
Na primeira parte, Maquiavel caracteriza o Estado como governos que têm poder sobre os homens, e são repúblicas ou principados. Segue mostrando que os principados são hereditários, novos e mistos. Mais adiante trata do principado civil e do eclesiástico. Este último é tão forte e de tanta eficácia que não importa como seus príncipes procedem e vivem, ainda assim mantêm-se no poder. Vemos nessa observação de Maquiavel uma cutucada na igreja em relação a sua conduta corruptível e força alienatória diante do povo. O autor aconselha que quem adquire um território, desejando conservá-lo, deve tomar em consideração duas coisas: uma, que a estirpe do seu antigo príncipe desapareça; a outra, não alterar as suas leis, nem os seus impostos. Assim, dentro de um brevíssimo tempo, formam um corpo só.

sábado, 2 de fevereiro de 2008




FILÓSOFO DO MÊS - DAVID HUME


"A maioria dos homens têm tendência natural para manifestar suas opiniões de modo afirmativo e dogmático e, como visualizam os objetos sob um único aspecto e como não têm qualquer idéia de argumentos opostos, lançam-se precipitadamente aos princípios para os quais estavam inclinados e não são indulgentes com aqueles que abrigam opiniões contraditórias. A dúvida ou suspeita gera perplexidade em seu entendimento, bloqueia sua paixão e interrompe sua ação. Portanto, impacientes para escapulir de uma situação que lhes é tão desagradável, os homens supõem que unicamente aderindo às afirmações violentas e crenças obstinadas conseguirão afastar-se o bastante dela. Mas, se tais homens que raciocinam dogmaticamente pudessem ter consciência da singular fragilidade do entendimento humano, inclusive em seu estado mais perfeito e quando é mais rigiroso e prudente em suas resoluções, semelhante reflexão os inspiraria naturalmente a ter mais modéstia e reserva, diminuindo a exagerada opinião que têm de si mesmos e seus preconceitos contra os adversários. Os ignorantes devem refletir acerca da situação dos sábios que, embora usufruindo de todas as vantagens advindas do estudo e da reflexão, se mostram geralmente desconfiados de suas afirmações. E, se algum sábio tende, por seu temperamento natural, à altivez e à obstinação, uma leve tintura do pirronismo poderia abater seu orgulho e mostrar-lhe que as poucas vantagens que obteve sobre seus semelhantes são insignificantes se comparadas à confusão e à perplexidade universais inerentes à natureza humana. Em geral, há um grau de dúvida, de prudência e de modéstia que, nas investigações e nas decisões de todo gênero, deve sempre acompanhar o homem que raciocina corretamente.(...)Aqueles que têm propensão para a filosofia continuarão ainda suas pesquisas, porque refletem que, além do prazer imediato que acompanha tal ocupação, as decisões filosóficas nada mais são do que reflexões sobre a vida cotidiana, metodizadas e corrigidas."


(Investigação acerca do entendimento humano - página 151-152)

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Dawson's Creek e Filosofia
Nem toda obra cinematográfica estimula a reflexão filosófica, algumas delas são verdadeiras armas de alienação e outras visam mais o entretenimento reproduzindo o imaginário popular e o senso comum. Dawson's Creek destaca-se como uma série que mais do que entreter, discute situações e problemas sob um olhar crítico e atípico. Em seis temporadas conta a vida de cinco amigos, Dawson, Joey, Pacey, Jen e Jack que em Capeside, uma pequena cidade do litoral, perto de Boston, convivem com os mais diferentes tipos de problemas no cotidiano, que os fazem crescer para entender melhor o mundo em que vivem. Em meio aos dramas do dia a dia,aprendem que com amor e amizade, o caminho que percorrem será bem menos difícil de suportar. A série discute temas como: adultério feminino, abuso do poder, politica, ética, religião e intolerância, homoafetividade, liberdade, dialética, morte, uso de drogas, preconceito e muito mais. Cada temporada surpreende por não se conformar com os típicos desfechos esperados aos personagens de uma série que trata de jovens e seus dilemas. Difícil não se emocionar com as perdas e o resgate da essência do que é amizade que permeia toda a série. Os episódios tornam-se vivos e marcates a medida que dialogam com os telespectadores fazendo-os refletir sobre o tempo em que vivem, levando-os à necessidade de quebra de paradigmas e de assumir mudanças efetivas. Uma boa opção para aqueles que gostam de pensar as possibilidades do ensino de filosofia através da TV.


Meus aforismos:

◘ "Descobri que sou um ninguém pensando ser alguém, ou um alguém pensando ser ninguém."

◘ "Acabei de perceber que busco sentido nas coisas, quando elas não precisam, pois são o que cada um quer que elas sejam.Cada um põe a felicidade onde quer."

◘ "Entendi que o mundo é um choque de egos em que não há vencedores, apenas perdedores."

◘ "Acordei a tempo de poder olhar para mim mesmo e ver quão complexo, mutável e estranho sou."

◘ "Compreendi que a verdadeira amizade é estar de bem consigo mesmo.O melhor amigo do homem é ele mesmo."

◘ "Cheguei a conclusão de que podemos confundir a luz do sol com a do candeeiro.E isso doi, porque está além da matéria, ultrapassa o que a maioria medíocre enxerga."

◘ "Com colírio nos olhos beijo a angústia, pois ela é a oportunidade do encontro que tenho comigo mesmo."

◘ "Sei que aquilo que penso determina aquilo que vivo, por isso lutarei até o fim para poder pensar o que quero, só assim farei realmente o que quero."

◘ "É incrível a habilidade que temos para errar conosco, com os outros e com o Infinito."

◘ "O caminho mais cômodo, mais fácil e mais aceito nem sempre é o melhor.Estou em busca do melhor!"

◘ "É preciso saber lidar com o que foi, com o que é, e com o que será, do contrário podem ser entraves. O que foi, quando poderia ter sido e não foi, o que é ao que está pronto, acabado e não poderá ser o que não é. E o que será pela expectativa que não deixa espaço para a contingência."

◘ "Ser livre é não perder a visão das possibilidades.E nas possibilidades está a complexidade humana"

◘ "Se você acha que pode determinar o que os outros são com base no que dizem que devemos ser, e no que a maioria acreditou que todos fossem e até mesmo no que você é, pode crer que desconhece o que é profundo, e ainda está preso a superfície, ao preconceito e a alienação."

◘ "Dou gargalhadas dos que me julgam, porque ignoram que a cada segundo não sou o que sou, mas aquilo que não sou. O eu que se julga não é mais o mesmo quando acaba o processo de julgamento."

◘ "Triste é aquele que não enxerga além do preconceito, não olha o coração, mas o rótulo, tem medo dos outros e não de si mesmo."

◘ "O dado não é um material bruto que se oferece ao pensamento, mas sim aquilo que o pensamento pode encontrar."

◘ "Livre pensador é aquele que pode pensar em coisas que jamais pensou que ia pensar. Numa mente aberta sempre há espaços!"

◘ "O meu crepúsculo é minha maior esperança, porque é o anúncio de uma nova aurora."

◘ "Lidar com o outro não é como jogar numa "roleta russa", afinal o outro é extensão de mim mesmo e não simples receptáculos das carências das quais não tenho pleno domínio.Se não houver satisfação em si não haverá no outro."

◘ "Quando as ilusões perdem as máscaras, então resta o abismo do nada.E porque não mergulhar no nada?"

Nietzche tinha razão: o fim de todo filósofo é enlouquecer.
René Descartes e o Discurso do Método (Parte 2)
Na terceira parte, delineia uma espécie de moral provisória que não firam frontalmente seu método. Sendo a primeira obedecer a lei do país e se manter firme na religião em que se é instruído na infância, a segunda de ser firme e decidido nas ações, a terceira e de se preocupar primeiramente consigo mesmo do que com os outros ou do que está ao redor, enfim o de utilizar toda a vida em cultivar a razão e progredir no conhecimento da verdade. Na quarta passa pelas questões metafísicas provando a existência de Deus e da alma humana. Neste ponto ele chega a sua celebre frase: “penso, logo existo”. Mostrando que o homem pode duvidar de tudo, menos de que duvida, ou seja, se duvida, exerce a função do pensamento, e se pensa, existe. Sendo possível pensar a existência sem o corpo, e que é possível negar a existência do corpo mas não da alma pensante que é condição essencial para a existência,segue que a alma é distinta do corpo. Vinculando a idéia de pensar e buscar o conhecimento, há busca de um conhecimento mais perfeito, logo o ideal de perfeição, e se há o ideal há algo que lhe corresponda, ou o Ser correspondente, em outras palavras - Deus, de quem tudo o que se possui vem. A quinta parte é a mais densa de toda obra, e mais cansativa, trata da análise astronômica física de alguns fenômenos e por fim biológica quando se trata do funcionamento do coração e da circulação do sangue humano, finalizando com a distinção entre o homem e os animais destacando-se dois fatores: os animais não utilizam palavras ou outros sinais, arranjando-os como os homens o fazem para manifestar os pensamentos, e, os animais não agem por conhecimento mas por disposição de seus orgãos. Sendo assim, as almas dos animais não é da mesma natureza que as humanas, que são imortais. Por fim, na sexta parte, Descartes disserta acerca da importância de se dominar a natureza, por um conhecimento científico preciso a fim de se buscar o bem de todos, e as razões de ter escrito seu livro. Sendo a primeira, a má impressão a respeito de si e de suas motivações que poderia despertar nos outros se não publicasse sua obra, e a segunda o temor de falhar consigo mesmo e com seu público de não ter deixado coisas melhores do que poderia ter deixado. Em suma, Discurso do Método é um livro atual que trata das bases do conhecimento humano, do auxílio da dúvida na busca da verdade e da construção do conhecimento científico através de um método rigoroso e preciso, indicado para todo amante do saber e principalmente para aqueles que levam a sério seu ato de pensar.
René Descartes e o Discurso do Método (Parte 1)
Nascido em La Haye, França, no dia 31 de março de 1596, René Descartes estudou num colégio jesuíta e depois se formou em Direito. Engajou-se no serviço militar na Holanda, viajou pela Europa e no fim de seus dias viveu na Suécia, onde veio a falecer em 1650. Entre suas principais obras estão: Meditações, Regras para a Direção do Espírito, Princípios de Filosofia, As Paixões da Alma e Discurso do Método. Este último é um dos livros que constitui a base de sua epistemologia. Conforme o próprio livro informa está dividido em seis partes. Na primeira, há diversas considerações sobre a ciência. Na segunda, as principais regras sugeridas por ele para a prática científica. Na terceira, algumas das justificativas do método. Na quarta, as provas da existência de Deus e da alma humana,ou seja, os fundamentos da metafísica. Na quinta, Descartes faz algumas aplicações do método a questões físicas e relativas à medicina; também as particularidades da alma humana. Por fim, na sexta, as razões que o levaram a escrever o tratado e aquilo que Descartes acredita ser essencial para o progresso do conhecimento .Descartes abre a primeira parte do seu livro mostrando um pouco de suas vivências, sua determinação em desenvolver seu método e os caminhos que perseguiu. Em linhas gerais menciona a teologia, a filosofia, a jurisprudência e a medicina e suas respectivas funções. Mostrando o cuidado com que teve de procurar distinguir o verdadeiro do falso, de rejeitar a credulidade e a precipitação, e de determinar-se a examinar a si mesmo. O fim da primeira parte está embricado na segunda quando continua a relatar a experiência de seu auto-conhecimento quando esteve sozinho na Alemanha, a sua firme constatação da necessidade de reformar e construir seus próprios pensamentos, desembocando nas quatro regras de seu método: o de nunca aceitar alguma coisa como verdadeira que não fosse conhecida evidentemente como tal, evitando toda precipitação e prevenção; o de dividir as dificuldades para que melhor fossem analisadas; a condução do pensamento dos objetos mais simples aos mais complexos; e o de poder elaborar enumerações completas e revisões de que tivesse certeza de nada omitir. Na verdade, o Discurso propõe um modelo quase matemático para conduzir o pensamento humano, uma vez que a matemática tem por característica a certeza, a ausência de dúvidas.

Ponto de contato

Pare por um momento e reflita.Já pensou que as coisas estão aparentemente certas, porém estão profundamente erradas?Olhe a sua volta, observe as pessoas com que entra em contato e as que passam rapidamente pela sua vida, no metrô, no trem, nas ruas e avenidas desse país. Percebe as expressões sofridas, cansadas e tristes da maioria? Você se sente incomodado ou satisfeito ao ver que os indivíduos são escravizados pela rotina e pelas idéias propagadas pela mídia? Será que a resposta está mesmo no consumo desenfreado, naquilo que é tradicionalmente honrado e no mecanismo em que as coisas parecem funcionar? Está na hora de romper com esse círculo vicioso e perverso em que estamos inseridos. Precisamos nos descobrir realmente, e lutar pela liberdade. Liberdade de poder ser diferente, de discordar da maioria, de rejeitar as convicções que nos foram implantadas, de andar na contramão do sistema, de olhar para as pessoas e não ver "fontes de lucro", mas ter real interesse nelas. Que possamos nos despojar de todo preconceito, religiosidade, misticismo, politicagem, malandragem e violência.Que apliquemos o colírio da reflexão e rompamos com as ataduras dos valores que a sociedade espera que tenhamos e que nos faz meros exércitos de robôs.Possamos ousar ser!
Filosofia e Cidadania
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) a educação para o exercício da cidadania é o objetivo da Filosofia. Mas o que é cidadania? Segundo o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, “cidadania é a qualidade ou estado do cidadão”, entende-se por cidadão “o indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um estado, ou no desempenho de seus deveres para com este”. No sentido etimológico da palavra, cidadão deriva da palavra civita, que em latim significa “cidade”, e que tem seu correlato grego na palavra politikos – aquele que habita na cidade. É sabido que uma educação filosófica visa a autonomia e leva em consideração as problemáticas sociopolíticas, por isso não pode deixar de lado a formação do cidadão.Ser cidadão conforme podemos observar até mesmo na definição citada acima envolve atitude, é participar ativa e conscientemente na comunidade a qual se está inserido. Refletindo sobre a realidade do nosso país, pode-se apontar que ainda não conseguiu-se realizar o ideal de cidadania, ainda há privilégios para as elites. Urge no Brasil a necessidade de uma cidadania que seja ativa e que promova uma forma de ação política possível para o benefício de todo o conjunto da sociedade. Onde está a cidadania diante do quadro de desigualdade sócio-econômica que vivenciamos? Não é qualquer educação que colaborará com a construção da cidadania, mas uma voltada para a singularização dos indivíduos, para a constituição de mentes livres e criativas, e de seres humanos que tomem em suas mãos os destinos de suas vidas e comunidades,e ai entra a importância da Filosofia nessa construção. São os atos de cidadania que educam para a cidadania, e nós como professores devemos nos preocupar com nossa postura e atos em sala de aula, pois que tem grande influência, é a chamada pedagogia do exemplo. Para a filosofia cumprir seu papel de formar cidadãos não é somente necessário o estudo da história da filosofia, mas o exercício do filosofar na busca da construção de um pensamento próprio frente ao cotidiano e a vida, e que promova a liberdade, a criatividade e a solidariedade.

domingo, 27 de janeiro de 2008

Epicuro e a filosofia do prazer (Parte 3)
Prosseguindo, vimos que para Epicuro ainda era necessário mais um passo para conduzir o homem a felicidade. E este era a procura do prazer e a fuga da dor. Talvez você pergunte: "Que significa isso?" Vamos então ao esclarecimento:
Sobre esse ponto, Epicuro entendia que o sábio reconhecia que havia diferentes tipos de prazer, e sabia selecioná-los e dosá-los. O ponto de partida para a felicidade estaria então na satisfação dos desejos físicos, naturais. Porém, essa satisfação, para não acarretar sofrimentos, deveria ser contida, reduzindo-se ao estritamente necessário.Poderia se classificar os tipos de prazer em dois niveis: "prazer de movimento" e "prazer de repouso". O prazer de movimento seria o da satisfação física imediata e mutável; enquanto que o de repouso seria o de dimensão ética que era constituído pela 'ataraxia'(ausência de perturbação) e pela 'aponia' (ausência de dor). Para se chegar a esse prazer de repouso era necessário criar a consciência de que é necessário renunciar a todo prazer que possa ser fonte de aflição e aceitar a dor quando ela é portadora de um bem futuro. Dessa forma era então o homem capaz de ser feliz e sereno independente das circunstâncias. À dor presente, ensina Epícuro, pode-se escapar por meio da lembrança dos prazeres passados ou pela expectativa de prazeres futuros. Interiormente, o homem é livre para jogar, à vontade, com as imagens (eidola) que seriam resquícios corpóreos de suas sensações.
Epicuro fazia da contemplação intelectual e das delícias da amizade os mais elevados prazeres, legou às éticas posteriores uma lição que nunca mais será esquecida: a de que o homem também pode se sustentar de recordações e de esperanças.


Epicuro e a filosofia do prazer (Parte 2)


Epicuro apesar de sua debilidade física, era alguém positivo e que influenciava muito as pessoas. Qual era o segredo? Epicuro acreditava que a filosofia devia servir o homem como instrumento de libertação e como via de acesso à verdadeira felicidade. Para Epicuro haviam dois temores que impediam o homem de encontrar a felicidade: o medo dos deuses e o medo da morte. Qualquer semelhança com o medo dos nossos dias não é mera coicidência.Com relação a vencer o medo dos deuses, Epicuro refletia da seguinte forma: Os deuses de fato existiam, porém eram tão perfeitos, que jamais se misturariam conosco ou estariam se preocupando conosco, haja vista que somos imperfeitos e fracos. Em outras palavras, eles desconhecem o mundo imperfeito humano e não atuam sobre ele. Quanto ao medo da morte, não há também porque temê-la. Ela não seria mais que a dissolução do aglomerado de átomos que constitui o corpo e a alma. A morte, portanto, não existe enquanto o homem vive e este não existe quando ela sobrevêm. A libertação do medo dos deuses e da morte não basta para conduzir o homem a verdadeira felicidade, ainda era necessário mais uma coisa. E é o que veremos no próximo artigo, finalizando a reflexão sobre a filosofia epicurista.
Epicuro e a filosofia do prazer (Parte 1)
Se lhe perguntasse: "Você é feliz?" - o que você me responderia? Não sei sua resposta, mas já fiz essa pergunta para dezenas de pessoas e a grande maioria dizia que 'não era feliz', mas estavam 'buscando a felicidade'.
E você sabia que houve um filósofo chamado Epicuro que buscou também o caminho da felicidade,e filosofou a respeito disso? Pois é, para Epicuro o bem supremo da vida é a felicidade. Mas talvez você me pergunte: "quem era esse filósofo e o que ele tinha a dizer à respeito da felicidade?" E é isso o que vamos ver agora...
Epicuro viveu na Grecia, mais especificamente na cidade de Atenas entre 341-270 a.C.. Tinha uma doença muito terrivel que o atrofiava, porém era alguém com quem as pessoas gostavam de estar junto. Epicuro era descrito como bondoso, alguém que cultivava as amizades, auxiliava os irmãos e tratava delicadamente os escravos. Fico a imaginar que existem pessoas que por menos problemas se tornam amargas, inacessíveis e grossas. De fato, Epicuro era um exemplo! Um dos seguidores de sua filosofia, um poeta romano chamado Lucrécio disse dele: "Foi um deus, sim, um deus, aquele que primeiro descobriu esta maneira de viver que agora se chama sabedoria, aquele que por sua arte nos fez escapar de tais tempestades e de tais noites, para colocar nossa vida numa morada tão calma e tão luminosa."

sábado, 5 de janeiro de 2008


Filósofo do mês: Aristóteles
"Duas condições são necessárias para alcançar o bem geral; primeiramente, que haja um ideal e que o fim que se porpõe sej alouvável;depois, que se encontrem quais são os atos que podem conduzir a esse fim.Essas duas condições podem ou não concordar-se. Ora, o fim é excelente, mas erra-se no meio de atingi-lo. Umas vezes têm-se todas as possibilidades de alcança-lo, mas o fim proposto é mau. Outras vezes erra-se ao mesmo tempo no fim e nos meios, como acontece na Medicina, quando julga mal o estado de saúde do corpo, e não encontra os meios de atingir o fim que se propõe. Ora, nas artes e nas ciências, é preciso apontar magistralmente ao alvo e aos meios que a ele conduzem. É claro que todos os homens aspiram à virtude e à felicidade; mas uns podem atingi-las, outros não (asim o quer o acaso ou a natureza). A virtude necessita de uma certa quantidade de meios, que deve ser pequena para aqueles que são melhores dispostos, e maior para os que têm disposições menos favoráveis. Outros, finalmente, extraviam-se desde os primeiros passos na procura da felicidade, embora possuam todas as faculdades exigidas. Já que o objeto que nos propomos é a procura da melhor constituição, já que a melhors constituição é aquela que dá a melhor administração da cidade, e que a melhor administração da cidade é a que proporciona a maior soma de felicidade, segue-se que é preciso antes saber o que é a felicidade.(...)A felicidade é o resultado e o desenvolvimento completo da virtude, não relativa, mas absoluta. Ora, por virtude relativa entendo aquela que se aplica aos atos necessários,e por virtude absoluta é que se dirige unicamente ao belo.(...)Por oposição, os atos que têm por objetivo a honra e abundância de bens da alma, são o que há de mais belo no sentido absoluto.(...) Na Moral, definimos o homem virtuoso como sendo aquele cuja virtude eleva os bens interiores à altura de bens absolutos. É evidente que a maneira pela qual deles faz uso é forçoasamente nobre e bela no sentido absoluto. Eis no entanto que o vulgar julga que os bens exteriores são causas da felicidade, como se o talento e a perfeição com que o músico toca a lira fossem devido mais à qualidade do instrumento que à habilidade do artista."(Aristóteles -A Política - página 105)

terça-feira, 1 de janeiro de 2008


Pérolas da filosofia de Erich Fromm

Erich Fromm (1900-1980) foi um filósofo e psicanalista alemão, autor de muitas obras, entre as quais "O Medo e a Liberdade", "A sociedade sã" e "A Arte de Amar", estudou e refletiu sobre a influência da sociedade e da cultura no indivíduo.Para Fromm, a personalidade de um indivíduo era o resultado de fatores culturais e biológicos. Neste aspecto estava em desacordo com Freud, que privilegiava sobretudo os aspectos inconscientes do psiquismo. Fromm integrou os aspectos socio-económicos na explicação das neuroses e estabeleceu um relacionamento entre o marxismo e a psicanálise.

Penso que algumas das idéias de Fromm podem contribuir para uma entrada de ano consciênte, certa das possibilidades de exito e preparada para lidar com as frustrações, fazendo uso delas para nosso crescimento pessoal e autonomia. Vejamos:

* A pessoa torna-se livre e cresce através de atos de desobediência, que é condição de liberdade. Temos assim a capacidade de duvidar, de criticar e de desobedecer.

* Aceitação do fato de que ninguém e nada fora de nós pode dar significado à nossa vida.

* Desenvolver a própria fantasia, não como fuga de circunstâncias intoleráveis, senão como antecipação de possibilidades concretas, como meio para superar circunstâncias intoleráveis.

* Dar-se conta de que o mal e a destrutividade são consequências necessárias da falência do propósito de crescer.


Para terminar algumas citações diretas e importantíssimas de Fromm:

"Os fatos não são, na sociedade, a realidade última na qual o conhecimento encontraria o seu próprio fundamento e critério, porque eles próprios são mediados pela sociedade."

"O perigo do passado era que os homens se tornassem escravos. O perigo do futuro é que os homens se tornem autómatos."

"A maior parte das pessoas vê no problema do amor, em primeiro lugar, o problema de ser amado, e não o problema da própria capacidade de amar."

"A ânsia de poder não é originada da força, mas da fraqueza."

"A principal tarefa na vida de um homem é a de dar nascimento a si próprio."